Cemitério dos Pássaros

“Longe da feição macabra, devemos ver apenas, no cemitério, uma alta expressão do passado, suavemente lembrada pela saudade”.

Pedro Bruno

Croquis-Cemitério5
Croqui

Pedro Bruno aliava, a seus dons artísticos e a seu zelo pela natureza, um devotado espírito público. Assim, ao tornar-se Oficial Administrativo comissionado pela Prefeitura, no cargo de zelador do cemitério da Ilha (Cemitério de Santo Antônio), implementou reformas que – com o toque magistral da sua arte de Mestre – transformaram o campo-santo num verdadeiro jardim, um local aprazível e convidativo à visitação.

O terreno onde passou a localizar-se a necrópole, situado numa suave encosta, havia pertencido anteriormente à Sra. D. Maria da Conceição, que doou-o à Mitra. A Irmandade que o ocupou não conseguiu, por falta de recursos, mantê-lo limpo e conservado. Com aspecto de terreno baldio, invadido pelo matagal, o campo sagrado perdeu sua integridade. Por decreto municipal de 23 de maio de 1860, o  local foi desapropriado e transformado em área de utilidade pública. Esta medida repercutiu de forma positiva no seio da população paquetaense, que confiou a Pedro Bruno a tarefa de recuperação do patrimônio.

Mais do que recuperá-lo, Pedro Bruno efetuou no terreno uma radical transformação, fazendo surgir ali um autêntico cemitério, um local digno, ornamentado com os requintes de um esteta. As alamedas foram ajardinadas com vegetação adequada. Foram plantados roseirais, ciprestes, chorões e esplêndidos tamarineiros – cobertos por barbas-de-velho franjadas – por entre os alvos túmulos. A reforma da Capela contou com a colaboração da Liga Artística, entidade fundada por Pedro Bruno em 1923 com a finalidade de proteger e conservar os patrimônios naturais e culturais da Ilha.

interior da capelado cemitério com o quadro São francisco falando comos pássaros
Capela do cemitério

Acima de um conjunto de pedras de cerca de dois metros de altura, foram levantadas três arcadas em estilo gótico. A seleção das pedras, em tons de cinza, foi feita pelo próprio artista, uma a uma, de acordo com as variações de tamanho e de tonalidade. As paredes ostentam ornatos em forma de pombas e de lírios, que destacam-se visualmente por sua brancura. O velório localiza-se ao centro das arcadas, onde também estão dispostos nove bancos de cantaria para as funções fúnebres. Ao fundo, ainda na parte central, encontrava-se o quadro “Cristo ao Luar”, de autoria de Pedro Bruno. Na varanda lateral há um singelo altar, dedicado a São Francisco de Assis, o santo que amava a natureza e, em especial, os pássaros. Encimando este altar estava outra tela do pintor, “São Francisco falando aos Pássaros”. Foi criado também um jardim, ao lado da capela, com um lago destinado a matar a sede dos passarinhos que, assim como as árvores, eram seres muito caros ao artista.

Uma expressiva inovação, que demonstra a sensibilidade da alma deste artista-empreendedor, foi a criação da “Ara da Saudade”. Em pedra tosca e escavada eram mantidas, permanentemente acesas, brasas nas quais parentes e amigos podiam depositar uma colherinha de incenso em memória de seus entes queridos, no Dia de Finados.

Pedro Bruno - Atelier em Paquetá
No atelier da sua casa

A terra exercia sobre Pedro Bruno uma influência profundamente mística. E foi esta terra – o solo do Cemitério de Paquetá, fruto de seu trabalho e de seu carinho, sob o tamarineiro que ele mesmo plantou – que recebeu seu corpo, cercado pelos familiares e pela multidão de cidadãos saudosos, em seu derradeiro adeus.